Muito se tem falado de etnia, mas por tudo o que tenho visto, especialmente nas redes sociais, não estou certo de que o significado do termo tenha sido ainda corretamente assimilado.
Primeiramente, é essencial fazer uma distinção entre os termos “raça” e “etnia”. A ideia de “raça” se refere ao âmbito da biologia, ao passo que “etnia” é um conceito ligado ao âmbito da cultura. Hoje em dia, com o amadurecimento dos conceitos antropológicos, especialmente depois que ideias e ideais relativos à “raça” resultaram em catástrofes como o Holocausto Nazista, “raça” é um conceito que vem gradativamente caindo em desuso, tornando-se obsoleto no que diz respeito à espécie humana. Aos poucos, tem-se chegado à conclusão de que fenótipos, quer dizer, características físicas, como cor de pele e tipo de cabelo, são insuficientes para dar conta da complexidade humana.
Em função disso, o termo “etnia” vem ganhando popularidade nas discussões sociais, sem que seu significado, um tanto mais abrangente, seja devidamente conhecido por todos que tomam parte nessas discussões.
Etnia deriva do grego ethnos , que, em português, pode ter seu significado traduzido como “povo”. Esta palavra teve diversos significados em momentos históricos diferentes, servindo, algumas vezes, para designar grupos humanos que ainda não haviam sido cristianizados, por exemplo. Originalmente, porém, ela se refere a qualquer grupo de pessoas que compartilham uma identidade, dada pela história, língua, religião, costumes, vínculos de ancestralidade, etc..
Desde o início, como podemos observar, a palavra está impregnada de um sentido de reconhecimento mútuo. Uma etnia ou grupo étnico é, assim, toda comunidade ou grupo humano que se reconhece em torno de uma mesma identidade e valores sócio-culturais.
Historicamente, a língua, um mesmo idioma comum, tem sido usada como um dos fatores primários de identificação e classificação dos grupos étnicos (semita, indo-arianos, etc.), mas é preciso levar em consideração que existem línguas multi-étnicas, assim como etnias multi-língues. Para citar um exemplo, o aramaico foi uma língua falada por muitos povos (etnias) diferentes do Oriente Próximo no início da Era Comum (século I em diante). O aramaico era o que se pode chamar de uma língua multi-étnica. Por outro lado, o povo hebreu estava familiarizado, nesta mesma época, além do hebraico, considerado desde sempre a sua língua ancestral, com o aramaico, o koiné, e, dependendo da região, outras línguas, como o latim e o copta. O povo hebreu era, portanto, aquilo que se pode chamar de uma etnia multi-língue.
Em virtude dessas variações, outros traços culturais, como religião e estrutura sócio-política, também precisam ser levados em conta ao delimitar-se uma identidade étnica, mas é extremamente difícil marcar as fronteiras culturais, especialmente para povos que estiveram em intenso contato com outros povos por períodos prolongados de tempo. A cultura, tal como um ser vivo, não permanece estática, ela se modifica, se transforma, enriquecendo-se ou desaparecendo no curso da História.